Com mais de 25 anos de experiência no setor audiovisual, Guilherme Fiúza destaca-se pela sua colaboração com renomados diretores. Em 2014, dirigiu, roteirizou e produziu a adaptação internacionalmente aclamada de "O Menino no Espelho". Atuou como parecerista em diversos editais no Brasil e dirigiu séries notáveis, incluindo “Cientistas Brasileiros”. Nos últimos anos, ele também dirigiu a série “Minha Família É” e o longa de animação “Chef Jack – O Cozinheiro Aventureiro”.
Seu trabalho mais recente, a série em animação "Cosmo – O Cosmonauta", da qual é diretor e produtor, reforça sua influência no cenário da animação brasileira. Nesta entrevista, Guilherme compartilha insights sobre as tendências que moldam a indústria de animação atualmente, explorando temas como a descentralização da produção e a consolidação do mercado brasileiro de animação.
Sebrae Minas: Quais são as principais tendências atualmente na indústria de animação?
Guilherme Fiúza: Antes de tudo, devemos falar do retorno da produção. Passamos quatro anos sem nenhum lançamento e o que estamos lançando agora foi produzido neste tempo. Porém, como nós não tivemos financiamento, no caso para o cinema e para as séries, tivemos um gap grande, pois ficamos sem ter como financiar novas animações neste tempo.
Com isso, devemos voltar a ter lançamentos na sala do cinema daqui a dois anos, no mínimo. Isso é terrível, mas ao mesmo tempo temos que comemorar que estamos voltando. E aí uma das coisas que eu percebo claramente, primeiro, é que a animação brasileira se consolidou como um mercado produtivo. “O Irmão do Jorel” é um grande sucesso, e temos também “O Show da Luna”.
Além disso, temos uma coisa interessante que é a descentralização da produção. De uns anos pra cá começamos a ter produtores de outros estados, fora do eixo Rio e São Paulo, que passaram a produzir animação. Por exemplo, eu e o Luiz Fernando estamos finalizando a primeira série mineira de animação e estamos negociando com uma grande companhia da América Latina.
Então acho que temos uma possibilidade grande de ampliação de mercado e devemos começar a olhar para Minas Gerais com outro olhar. Porque a grande incerteza que existe é o que chamamos de deliverys, ou seja, se a empresa tem a capacidade de entregar. À medida que você fecha com grandes canais e começa a ser distribuído nacionalmente, de forma muito forte, a gente passa a ter outra visibilidade. Então acho que essas são as principais tendências hoje na animação: a possibilidade de novos mercados e uma abertura maior para outras regiões.
Como a diversidade e a inclusão estão sendo abordadas na indústria de animação?
Vejo que temos buscado ações afirmativas e inclusivas não só nos personagens, mas também nas equipes dos projetos. Também temos outra coisa interessante, que é a preocupação da formação. Costumo brincar que quando você sai da faculdade de engenharia, você é engenheiro; quando saí da faculdade de cinema, você não é cinearte, e quando você sai da faculdade de animação, você não é animador ali. São muitos os aprendizados e isso fica a cargo das produtoras.
Nos Cosmonautas, por exemplo, a gente foi para dentro da universidade e fizemos não só um curso de formação, mas também de animação de software. De lá conseguimos tirar três alunos que trabalharam com a gente. Então não só nos personagens, mas também nas contratações e na formação, pois temos um déficit de mão de obra muito grande. Esse déficit não existe porque não temos gente no mercado, mas porque as pessoas se formam e vão trabalhar fora.
Como a tecnologia está impactando a produção de animação e influenciando novas abordagens criativas?
Temos a possibilidade de usar algumas coisas, porque com ela conseguimos baratear alguns processos. Mas ela não tem a coisa mais importante, que se chama criatividade. A inteligência artificial é replicante, ela replica o que criamos e a ideia original, que é o principal da história. Então ela tem um processo de baratear muitos processos e possibilidade de remanejar os custos, mas ainda vejo o seu uso como muito incipiente na nossa área.
Qual é o papel das plataformas de streaming na evolução das narrativas animadas?
A plataforma acaba sendo muito mais uma nova janela para a comercialização dos nossos produtos. Há um tipo de produto para o streaming que eles chamam de original, que são conteúdos feitos sob encomenda. Eu não conheço nenhuma animação que foi feita por encomenda ainda, e tem a questão legal de que quando você produz um original você não pode comercializá-lo depois para outra plataforma, ele pertence àquela plataforma.
O que seria mais interessante, e o que estamos tentando fazer, é que o direito patrimonial permaneça no Brasil para que possamos ter carteira. O que é mais legal em uma distribuidora: ela chega e faz uma venda não de um filme, mas de uma carteira de 20 / 30 filmes e aí a arrecadação é muito maior e é mais interessante para a gente.
Não estou falando que o streaming é ruim, ele só faz parte do processo, a cauda longa do audiovisual. Então o streaming até agora não se mostrou muito como um desenvolvedor conosco para projetos, ele ainda é uma janela para divulgação e comercialização, sendo necessário regulamentá-lo.
Quais são as previsões para o futuro da animação nos próximos anos?
Para mim a animação talvez seja uma das maiores ferramentas de informação que temos, primeiro porque ela fala com um público muito ávido que é o mercado infantojuvenil. Segundo, na internacionalização, o mais difícil é a dublagem. Muitos povos não gostam de legenda, não é só no Brasil, e na animação a dublagem é muito bem-vinda, porque lida com um público que nem sempre está alfabetizado para ler legendas.
Todo mundo age como se desenho animado fosse só para criança. Não é. Ele é uma técnica de linguagem usada, mas a maior parte do que produzimos no Brasil é voltado para o mercado infantil ou infantojuvenil e este é um grande público que a cada ano se renova. Eu sempre falo que o meu público cada ano é um, ele não envelhece, ele se renova e isso é muito interessante.
Voltando à questão das tecnologias elas estão mais baratas, os softwares melhoraram, então ela é um grande caminho para a gente. Temos provas disso, com vários produtos no Brasil, como Carrapatos Catapultas, Show da Luna, Irmão do Jorel, e tudo vi nascendo há 13 anos atrás, como o primeiro edital público que previa a produção de animação para TV. Além disso, a tecnologia permite uma produção em série, o que gera empregos longos.