O mercado editorial está em constante evolução, impulsionado por avanços tecnológicos e mudanças nas preferências dos consumidores. Essas tendências refletem a busca por inovação, adaptação às demandas do público e aproveitamento das oportunidades oferecidas pela tecnologia.
Neste texto, a escritora, editora e sócia-fundadora da IBI Literrário, Carola Castro, explora duas grandes tendências que estão moldando o cenário atual do mercado editorial: como sistemas de Inteligência Artificial (IA) estão deixando sua marca no mundo literário; e de que formas a digitalização da literatura impacta o trabalho de escrita e editoração e a formação de novos leitores.
“São situações desafiadoras e que exigem muita reflexão, mas também acho que a gente não pode ter medo do novo, principalmente a nossa indústria, que é da criação”, diz Carola.
Impactos da Inteligência Artificial
A IA está mudando a forma como lemos e interagimos com a literatura. Recomendações de livros baseadas em algoritmos personalizados estão se tornando comuns, permitindo que o público descubra obras de acordo com suas preferências. E com a entrada da Inteligência Artificial nos sistemas de produção, o mercado editorial passa por um momento ímpar, com ferramentas poderosas para aprimorar a escrita e a criação literária.
Carola Castro acredita que a IA vai transformar a indústria criativa como um todo e de forma estrutural, mas, na literatura, ela cria desafios específicos.
“Com essas ferramentas, o escritor vai se deparar com dois caminhos: ou ele se torna um profissional completo, das artes e da escrita; ou vai cair no ostracismo e perder espaço”, diz.
Hoje, estão sendo desenvolvidos e colocados no mercado diversos sistemas de IA de escrita, elaboração e desenvolvimento de ideias, roteiros e sinopses. Algoritmos de IA podem analisar padrões e tendências, gerar ideias e até mesmo escrever textos com relativa fluência. Na literatura, essas ferramentas criam novas dinâmicas. Ao mesmo tempo em que há uma permanência da necessidade de criar e das subjetividades da escrita, os sistemas de IA trazem uma dinâmica mais ágil de produção que ameaça o escritor independente que tenha alguma imaturidade técnica.
Carola explica que, de forma geral, os primeiros trabalhos de autores independentes não passaram ainda por sistemas editoriais e são produzidos e publicados de forma autônoma – e, muitas vezes, falta maturidade. “E tudo bem, porque esse é o primeiro passo, e deve ser incentivado. Mas quando essas obras chegam a um mercado que é altamente competitivo, agora também ocupado pelas IAs, perde-se espaço para essa literatura”, diz.
Para a idealizadora do Ibi-Literrário, empresa social voltada ao fomento da literatura independente, esse cenário vai levar escritores, editores, revisores e todo o sistema envolvido com a literatura a se aprimorar.
Ao mesmo tempo, leva à criação de espaços em que a subjetividade tenha mais valor: “a subjetividade vai ser crítica, mas ela vai precisar, também, ser refinada. E eu não sei até que ponto a indústria criativa editorial está antenada, preocupada ou debatendo esse cenário”, diz. Para ela, é essencial entender quais são os impactos, os limites e os benefícios relacionados à presença crescente e acelerada da IA na indústria criativa e na produção literária.
Digitalização da literatura
Com o avanço da tecnologia, o crescente consumo de e-books e de dispositivos de leitura e o uso de plataformas de publicação online para produções literárias, a digitalização está moldando o futuro da literatura. Esses novos formatos e estilos saem do objeto livro e exigem maior entrega do escritor e do sistema de editoração.
Além disso, Carola acredita que essa tendência deve (ou deveria) impactar na reformulação dos espaços literários, como livrarias e bibliotecas. Segundo ela, são espaços em que a maior parte das pessoas tem um primeiro contato com a literatura e que, ainda hoje, são organizados de forma totalmente analógica e pouco interativa.
Assim, os ambientes de maior acessibilidade à literatura tendem a se tornar obsoletos e desconectados do público se não passarem por uma onda de transformações a partir do debate sobre novas tecnologias e digitalização da leitura. É uma preocupação associada à capacidade do setor editorial em formar novos leitores e escritores. “Eu, que sou escritora, leitora e editora, não consigo mais ler um livro sem parar para pegar no celular. Isso já faz parte de mim e já me adaptei, mas muitos não conseguem conceber essa vinculação”, diz.
O afastamento da literatura de um cenário cada vez mais digital leva ainda ao fortalecimento da indústria audiovisual, com uma tendência do uso de IA para produção de histórias.
“A IA tem a tendência da repetição e consegue produzir roteiros com facilidade, mas a subjetividade de contar uma nova história, de forma diferente, vai estar fora do audiovisual se a gente não trouxer a literatura para o atual”, opina.